O descaso como projeto

Micael Olegario
3 min readAug 1, 2021

--

Os recentes acontecimentos envolvendo o incêndio da Cinemateca brasileira, a queda da plataforma Lattes e os cortes de orçamento no CNPq revelam um descaso intencional com o futuro do Brasil

O governo atual se esforça para queimar a cultura brasileira — Photo by Gaspar Uhas on Unsplash

As nossas tragédias se repetem e agora foram incorporadas em um projeto de destruição e apagamento da história e cultura brasileira. Não é novidade para ninguém que, sob a gestão atual de Jair Bolsonaro, a educação, cultura e ciência foram negligenciadas e deixadas de lado. Uma estratégia deliberadamente pensada de uma política nefasta e ignorante para ceifar o futuro do país. Desde o início do governo, instituições como o Ministério da Educação (MEC), o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e o CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) vêm sofrendo ataques e cortes brutais de orçamento.

Sem investimentos em ciência e educação, nenhuma nação se desenvolve. O cenário internacional mostra isso, os países que mais se destacam são justamente aqueles que possuem melhores índices de educação e de desenvolvimento científico. Não investir nestas áreas é um tiro no próprio pé, pois deixa o país refém de importar técnicas e tecnologia de fora. Este projeto de falta de incentivos à ciência condena o Brasil a uma posição secundária na geopolítica e economia mundial.

Dados do Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) e divulgados pelo G1 mostram uma redução constante do orçamento do MEC desde 2015. Como se não bastassem tais cortes, o governo atual demonstra total despreparo e falta de organização para gerir a pasta. Cabe lembrar que, durante 14 meses, o MEC foi comandado por Abraham Weintraub, o qual colecionou polêmicas ao invés de cuidar da educação do país. Problemas no Enem, ataques à China, aos ministros do STF, à democracia e às universidades brasileiras, marcaram a passagem do ex-ministro pelo MEC. E no final, pelos seus serviços ao projeto do governo atual, Weintraub ganhou um cargo nos EUA com salário de R$ 115,8 mil por mês.

Agora assistimos ao incêndio de vários documentos e filmes da Cinemateca Brasileira em São Paulo. Mesmo com alertas dos funcionários do local e do Ministério Público, o governo nada fez para evitar a tragédia, afinal apagar a história e a cultura nacional também é parte de seu projeto negacionista.

Mas o descaso proposital não para por aí. Nos últimos dias, o governo anunciou corte de R$ 116 milhões nas bolsas de pesquisas do CNPq. A alegação como sempre é de falta de recursos e remanejamento de orçamento. No entanto, será mesmo esta a razão dos cortes? É difícil crer nisso quando o mesmo governo estuda o aumento do fundo eleitoral de R$2 bilhões para R$4 bilhões, depois da reação negativa da aprovação do aumento para R$5,7 bilhões. A incoerência fica clara quando Bolsonaro uma hora afirma que irá vetar o fundão, e na outra sinaliza que não pode vetar o aumento, demonstrando sua incapacidade e/ou falta de vontade de governar. Fato é que recursos para serem gastos pelos políticos existem, mas para investimentos em pesquisa aparentemente não.

Também recentemente a plataforma Lattes, onde estão os currículos e dados das pesquisas do CNPq, foi afetada por uma “falha” técnica. Falhas técnicas realmente ocorrem até nos melhores sistemas, porém, ao analisar-se a conjuntura dos fatos, percebe-se que esta falha, bem como o incêndio na Cinemateca e os cortes orçamentários não são meras coincidências ou infelicidades. Tudo isto são frutos do descaso como um projeto de governo idealizado pela extrema-direita fanática e negacionista representada por Bolsonaro e seus aliados.

Seja através do impeachment ainda antes das eleições de 2022, ou por meio do voto auditável e seguro nas urnas eletrônicas, urge que a população brasileira dê um basta nessa política de destruição. Se for com o retorno da esquerda ou com uma terceira via, só o futuro dirá, mas o que não se pode admitir é a perpetuação no poder daqueles que desprezam a democracia, a ciência, a educação e a cultura brasileira.

--

--

Micael Olegario

Estudante de Jornalismo — Unipampa. Autor do livro Destinos Casuais. Instagram: @micael_olegario